Conhece a História do Cantão?

A galera lá do morro tá sabendo, hoje vai ter festa na casa do Pequeno, aquele molequinho que tá sempre no Cantão. Neguinho tá dizendo que ele mora na maior mansão. Éh, a galera sempre aumenta mas a cachanga é de responsa, no 550. Tem deck, piscina, quem vê não imagina que o Pequeno mora lá - É, o cara é gente fina - ele desce todo dia a pé pro Cantão junto com um pretinho que se chama Janjão, as vezes com o Nem, às vezes com o Baya, as vezes sem ninguém mas tá sempre lá na praia. Chega sozinho e todo mundo já conhece, chega cedinho e só sai quando escurece, pega o seu skate e vai direto pra favela pra andar no half-pipe lá da "curva do S". Éh, nem parece que ele é filho de bacana, a aparência às vezes engana mas a grana, no caso, não faz diferença, muito pelo contrário, a grana é o de menos. A galera da favela vai marcar uma presença hoje tem aniversário na casa do Pequeno.

Ele mora ali de frente pro mar, mané, mas é pertinho do morro, a galera vai a pé. Pra entrar no condomínio tem até segurança, mas não barrou ninguém! Vâmo pra festança! Olha quanta coisa bonita!

- Pequeno!!

- Peraí maluco num grita!

- Ele mora ali naquela casa que tá cheia de gente e cheia de carrão estacionado na frente. Todo mundo chique, de roupa social e agente assim largado, vai até pegar mal.

- É melhor sair fora pra não pagar mico, isso é festa de rico, não é pro nosso bico.

- Que isso, Chiquinho? Nada a ver! Quando é festa lá no morro o Pequeno é o primeiro a aparecer.

- É, se ele vive lá no funk e no pagode porquê no aniversário dele a gente não pode?

- É isso aí, Almir-Rato, o Pequeno convidou, e se a gente não entrar vai ficar chato.

- Vâmo nessa, galera, quem não deve não teme. O Tripa sempre vem aí jogar vídeo-game, diz pra ele Negão!

- Eu até ranguei aí outro dia, meu irmão! Não tem erro não.

- Demorô!!

- Aí, ó o Pequeno aí fora de bermuda e chinelo

- Chegaí!!

- Vambora!!

- Tá rolando um refri, cachorro e coxinha e tá sobrando um monte de gatinha.

E o Pequeno cresceu e nem se lembra dos presentes que ganhou, mas da festa ele nunca se esqueceu, a família reunida, os colegas da escola, a galera lá do morro e só discão na vitrola. Se esqueceu até do beijo da menina, mas se lembra da galera se jogando na piscina. As lembranças do tempo de moleque no Cantão ficaram marcadas na cabeça e no coração, como aquele cara que não tinha as duas pernas e subia num skate se arrastando na favela. A força de vontade daquele aleijado simbolizava a humildade e a batalha do favelado e a coragem que aquela gente tinha e tem são um exemplo de vida que o moleque aprendeu bem:

"Lutar pra viver, ser mais solidário e nunca vacilar, porque não há lugar pra otário e nem pra malandro demais. A malandragem é saber sobreviver em paz saber a hora de falar e a hora de ficar calado e respeitar pra ser respeitado". E se os ricos pensam que o convívio dos seus filhos com os pobres atrapalha a educação, o Pequeno aprendeu o que nenhuma escola pode ensinar convivendo com a galera do Cantão. Ele viu que a riqueza na verdade é viver com humildade e vencer o preconceito e ganhou o que nenhum dinheiro pode comprar: A amizade que até hoje guarda dentro do peito.

E a galera até hoje se reúne lá no canto, uns todo dia, outros nem tanto. Alô Gebara, Vaguinho, Pamonha e Passarinho. Bonito, Creck, Bila, Boc, Xêra e Maluquinho. Tim Dorê, Pinel, ****** e Gargamel. O Night entrou pro bicho e foi mais cedo pro céu. Abobrinha se mudou pra Fortaleza. O Déo já é papai e é fiscal da natureza, beleza, o Janjão virou piloto de asa e, quem diria, o Nenô virou crente e vai à igreja todo dia! Almir-Rato agora é professor de natação e o Bocão criou uma associação de surfistas da favela, da nova geração que vão continuar a história do Cantão.

Uma estória real, de paz e amor que hoje quem te conta é o Gabriel O Pensador, mas há dez anos atrás, mais ou menos, era mais conhecido como Pequeno.

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