Ou quer que postamos poesias de Oswaldo de Andrade?
De algum detalhe.
Vamos lá:
Os dois únicos livros de poesia publicados por Oswald de Andrade foram Pau-Brasil (1925) e Primeiro Caderno do Aluno de Poesia Oswald de Andrade (1927). A influência do poeta estende-se claramente até os dias atuais. Após sua morte, escritores como José Paulo Paes, os poetas concretos e os escritores da chamada poesia marginal beberam extensamente nas idéias do modernista.
José Paulo Paes e, posteriormente, os poetas marginais dos anos 70 e 80 praticaram o poema-piada, recurso lançado por Oswald. Os concretistas, por seu turno, valorizavam em especial a concisão do texto e o discurso anti-retórico presentes na poesia de Oswald de Andrade.
Naturalmente, os pontos abraçados por esses poetas representam o pomo da discórdia com as correntes literárias que se opõem a eles. O poema-piada, por exemplo, é abominado. Quem o critica entende que fazia sentido no primeiro momento do modernismo, quando um dos pontos-chave era manifestar a recusa à linguagem tradicional, ao "lado doutor", como ironiza Oswald no "Manifesto Pau-Brasil". Mas, passada essa fase, o poema-piada teria perdido o sentido com a consolidação das liberdades de expressão artística conquistadas pelo modernismo.
Ironicamente, o primeiro crítico do poema-piada foi exatamente Mário de Andrade, um modernista de primeira hora. Vale ressaltar que, a partir de certo momento, os dois Andrades da Semana de Arte Moderna colocaram-se em campos estéticos opostos. E também em rumos pessoais bem diferentes, já que os dois romperam a amizade em 1929. "O poema-piada é um dos maiores defeitos a que nos levaram a poesia contemporânea", escreve Mário no ensaio "A Poesia em 1930", a propósito do volume Alguma Poesia, de Carlos Drummond de Andrade.
Segundo Mário, "o poema-piada é a única restrição de valor permanente que se possa fazer a Alguma Poesia". Escrito durante os anos 20, o primeiro livro do poeta itabirano tem de fato essa característica protomodernista. (Há quem diga que os poemas-piada de Bandeira e Drummond são de outra estirpe. Mas não vamos entrar nisso, que é outra história.)
Fora da poesia, as idéias estéticas de Oswald de Andrade também tiveram forte reverberação na música popular, no fim dos anos 60, com o tropicalismo. Oswald está presente em várias canções do movimento, como "Tropicália" (Caetano Veloso), "Marginália II" e "Geléia Geral" (Gilberto Gil e Torquato Neto). Em "Geléia Geral", a colagem do letrista Torquato Neto inclui explicitamente mais de uma referência oswaldiana.
Veja alguns exemplos:
Erro de português
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português.
Vício na fala
Para dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mió
Para pior pió
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados
Canto de regresso à pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo.
(in Poesias Reunidas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971.)
Comments
João Volcon - O que realmente você quer saber?
Ou quer que postamos poesias de Oswaldo de Andrade?
De algum detalhe.
Vamos lá:
Os dois únicos livros de poesia publicados por Oswald de Andrade foram Pau-Brasil (1925) e Primeiro Caderno do Aluno de Poesia Oswald de Andrade (1927). A influência do poeta estende-se claramente até os dias atuais. Após sua morte, escritores como José Paulo Paes, os poetas concretos e os escritores da chamada poesia marginal beberam extensamente nas idéias do modernista.
José Paulo Paes e, posteriormente, os poetas marginais dos anos 70 e 80 praticaram o poema-piada, recurso lançado por Oswald. Os concretistas, por seu turno, valorizavam em especial a concisão do texto e o discurso anti-retórico presentes na poesia de Oswald de Andrade.
Naturalmente, os pontos abraçados por esses poetas representam o pomo da discórdia com as correntes literárias que se opõem a eles. O poema-piada, por exemplo, é abominado. Quem o critica entende que fazia sentido no primeiro momento do modernismo, quando um dos pontos-chave era manifestar a recusa à linguagem tradicional, ao "lado doutor", como ironiza Oswald no "Manifesto Pau-Brasil". Mas, passada essa fase, o poema-piada teria perdido o sentido com a consolidação das liberdades de expressão artística conquistadas pelo modernismo.
Ironicamente, o primeiro crítico do poema-piada foi exatamente Mário de Andrade, um modernista de primeira hora. Vale ressaltar que, a partir de certo momento, os dois Andrades da Semana de Arte Moderna colocaram-se em campos estéticos opostos. E também em rumos pessoais bem diferentes, já que os dois romperam a amizade em 1929. "O poema-piada é um dos maiores defeitos a que nos levaram a poesia contemporânea", escreve Mário no ensaio "A Poesia em 1930", a propósito do volume Alguma Poesia, de Carlos Drummond de Andrade.
Segundo Mário, "o poema-piada é a única restrição de valor permanente que se possa fazer a Alguma Poesia". Escrito durante os anos 20, o primeiro livro do poeta itabirano tem de fato essa característica protomodernista. (Há quem diga que os poemas-piada de Bandeira e Drummond são de outra estirpe. Mas não vamos entrar nisso, que é outra história.)
Fora da poesia, as idéias estéticas de Oswald de Andrade também tiveram forte reverberação na música popular, no fim dos anos 60, com o tropicalismo. Oswald está presente em várias canções do movimento, como "Tropicália" (Caetano Veloso), "Marginália II" e "Geléia Geral" (Gilberto Gil e Torquato Neto). Em "Geléia Geral", a colagem do letrista Torquato Neto inclui explicitamente mais de uma referência oswaldiana.
Veja alguns exemplos:
Erro de português
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português.
Vício na fala
Para dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mió
Para pior pió
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados
Canto de regresso à pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo.
(in Poesias Reunidas. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1971.)
Balada do Esplanada
Ontem à noite
Eu procurei
Ver se aprendia
Como é que se fazia
Uma balada
Antes de ir
Pro meu hotel.
É que este
Coração
Já se cansou
De viver só
E quer então
Morar contigo
No Esplanada.
Eu queria
Poder
Encher
Este papel
De versos lindos
É tão distinto
Ser menestrel
No futuro
As gerações
Que passariam
Diriam
É o hotel
É o hotel
Do menestrel
Pra me inspirar
Abro a janela
Como um jornal
Vou fazer
A balada
Do Esplanada
E ficar sendo
O menestrel
De meu hotel
Mas não há, poesia
Num hotel
Mesmo sendo
'Splanada
Ou Grand-Hotel
Há poesia
Na dor
Na flor
No beija-flor
No elevador
Não é incrível?
Um ótimo final de semana!!!
Aceitarás o amor como eu o encaro ?...
Aceitarás o amor como eu o encaro ?...
...Azul bem leve, um nimbo, suavemente
Guarda-te a imagem, como um anteparo
Contra estes móveis de banal presente.
Tudo o que há de melhor e de mais raro
Vive em teu corpo nu de adolescente,
A perna assim jogada e o braço, o claro
Olhar preso no meu, perdidamente.
Não exijas mais nada. Não desejo
Também mais nada, só te olhar, enquanto
A realidade é simples, e isto apenas.
Que grandeza... a evasão total do pejo
Que nasce das imperfeições. O encanto
Que nasce das adorações serenas.
Oswaldo de Andrade
Helda
Erro de Português
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o Ãndio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O Ãndio tinha despido
O português.
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Canto de Regresso à Pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo.
.............................................................................
Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
.....................................................................
Oferta
Quem sabe
Se algum dia
Traria
O elevador
Até aqui
O teu amor
..............................................................
O Capoeira
- Qué apanhá sordado?
- O quê?
- Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada.
...................................................................
A Descoberta
Seguimos nosso caminho por este mar de longo
Até a oitava da Páscoa
Topamos aves
E houvemos vista de terra
os selvagens
Mostraram-lhes uma galinha
Quase haviam medo dela
E não queriam por a mão
E depois a tomaram como espantados
primeiro chá
Depois de dançarem
Diogo Dias
Fez o salto real
as meninas da gare
Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis
Com cabelos mui pretos pelas espáduas
E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas
Que de nós as muito bem olharmos
Não tÃnhamos nenhuma vergonha.
Canto de regresso à pátria
Minha terra tem palmares
Onde gorjeia o mar
Os passarinhos daqui
Não cantam como os de lá
Minha terra tem mais rosas
E quase que mais amores
Minha terra tem mais ouro
Minha terra tem mais terra
Ouro terra amor e rosas
Eu quero tudo de lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte para lá
Não permita Deus que eu morra
Sem que volte pra São Paulo
Sem que veja a Rua 15
E o progresso de São Paulo
A descoberta
Seguimos nosso caminho por este mar de longo
Até a oitava da Páscoa
Topamos aves
E houvemos vista de terra
os selvagens
Mostraram-lhes uma galinha
Quase haviam medo dela
E não queriam por a mão
E depois a tomaram como espantados
primeiro chá
Depois de dançarem
Diogo Dias
Fez o salto real
as meninas da gare
Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis
Com cabelos mui pretos pelas espáduas
E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas
Que de nós as muito bem olharmos
Não tÃnhamos nenhuma vergonha.
OCASO
No anfiteatro de montanhas
Os profetas do Aleijadinho
Monumentalizam a paisagem
As cúpulas brancas dos Passos
E os cocares revirados das palmeiras
São degraus da arte de meu paÃs
Onde ninguém mais subiu
BÃblia de pedra-sabão
Banhada no ouro das minas
Oferta
Quem sabe
Se algum dia
Traria
O elevador
Até aqui
O teu amor
bem sao essas que eu sei espero que ajude