Contos Fabulosos: 82 – Os três Judeus ...?

por Millôr Fernandes

Eram três judeus, possuídos de nobres corações, longas barbas bem tratadas, sobrancelhas espessas e profundas, arraigadas convicções religiosas. Essas convicções não os levam, porém, a se afastarem dos princípios econêmicos traçados por razoáveis diretrizes internacionais, por definidas normas matemáticas, segundo as quais cada vintém gasto é um vintém de menos.

Pois bem, eram Isaac, Moisés e era também Elias. Elias Magro, Moisés Magro, Isaac Magro. Não de fome eram magros, porque comer, eles comiam, comiam barato, diga-se de passagem, mas comiam que lhes dêsse para sustentar o corpo enriquecido pelos azares da fortuna dos outros.

E não abandonavam as suas convicções religiosas, foi o que dissemos. E não se entreabandonavam também, sempre agindo juntos, trabalhando juntos, morando juntos, lutando juntos por tudo. Se um não gastava o dinheiro, o outro também não gastava, porque compreendia o alto motivo porque o primeiro não gastava, e o terceiro também não gastava porque, como diz certo cronista de sete em sete dias, era preciso conservar a solidariedade humana e porque, afinal, como dizem os politicos, estamos num regime democrático onde deve prevalecer a vontade da maioria.

Portanto, Elias, Isaac e Moisés não gastavam um níquel.

Lá veio o dia, porém, em que os três entraram numa igreja para ouvir uma prelação sacerdotal. E, terrivelmente, um dado momento, uma senhora começou a percorrer os bancos da igreja pedindo donativos para não sabemos o que. Os três judeus ficaram horrorizados. Mas logo apareceu a solução para o problema. Isaac foi ficando branco, foi ficando branco, suando, e desmaiou.

E então, Moisés e Elias carregaram-no para fora.

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